Ali estão porque você os pôs ali. /
O que fazer com eles / Cabe a você resolver”.
DIÁLOGOS: Richard Bach e Donald Shinoda
(Extraído da obra 'Ilusões' )
“Você nunca se sente só, Don?” – Foi no café em Ryerson, Ohio, que lembrei de perguntar.
- Espanta-me que...
“Psiu” – disse eu. – “Ainda não acabei com as perguntas. Você nunca se sente nem um pouco só?”
- O que você considera...
“Espere. Toda essa gente, só a vemos por alguns minutos. De vez em quando vejo um rosto no meio do povo, alguma mulher linda, brilhante como uma estrela, que me dá vontade de ficar e falar com ela, ficar ali parado, sem me mexer e conversar um pouco. Mas ela voa comigo durante dez minutos, ou não voa, e vai embora e no dia seguinte parto para Shelbyville e nunca mais a vejo. Isso é solidão. Mas imagino que eu não possa ter amigos duradouros, quando eu mesmo não sou duradouro”...
Ele ficou calado.
“Ou será que posso?”
- Posso falar agora?...
“Creio que sim”. – Os hamburgers naquele café vinham embrulhados pela metade em papel encerado fino, e quando eram desembrulhados as sementes de gergelim se espalhavam por toda parte – coisinhas inúteis, mas os hamburgers eram bons. Ele comeu calado e eu também, imaginando o que ele diria.
- Bem, Richard, somos ímãs não somos? Ímãs, não. Somos ferro, envolvido em fio de cobre e sem pré que queremos magnetizar-nos, podemos fazê-lo. Se despejarmos a nossa voltagem interna pelo fio, podemos atrair tudo que quisermos atrair. Um ímã não se preocupa com o modo como funciona. Ele é ele mesmo, e por sua natureza atrai certas coisas, deixando outras intocadas...
Comi uma batata frita e franzi a testa, olhando para ele.
“Você omitiu uma coisa. Como é que faço isso?”
- Você não faz coisa alguma. A lei cósmica lembra-se? Os semelhantes se atraem. Basta você ser o que é, calmo, límpido e brilhante... Automaticamente, enquanto brilhamos como somos, perguntando-nos a cada instante se é isso o que realmente quero fazer, só o fazendo quando a resposta for positiva, isto repele naturalmente aqueles que nada têm a aprender com que somos nós, e atrai aqueles que têm, e com os quais podemos aprender também...
“Mas isso exige muita fé, e enquanto isso a gente fica muito só”.
Ele olhou para mim estranhamente, por cima do hambúrguer que comia.
- A fé é uma mistificação. Não precisa de fé nenhuma. Precisa de imaginação. – Ele limpou a mesa entre nós, empurrando para o lado o sal e as batatas fritas, o ketchup, garfos e facas, e fiquei pensando o que iria acontecer, o que se materializaria diante dos meus olhos.
- Se você tiver a imaginação como um grão de gergelim – disse ele, empurrando uma semente como exemplo para o meio da clareira – todas as coisas lhe serão possíveis.
Olhei para a semente de gergelim, e depois para ele.
“Eu gostaria que vocês Messias se juntassem e se pusessem de acordo. Pensei que o negócio fosse ter fé, quando o mundo se vira contra mim”.
- Não. Eu quis corrigir isso, quando trabalhava, mas a luta foi árdua e longa. Há dois mil anos, há cinco mil anos, não existia uma palavra para imaginação, e a fé foi o melhor que conseguiram arranjar para um bando solene de adeptos. Além disso, não tinham sementes de gergelim.
Eu sabia que tinham sementes de gergelim sim, mas deixei passar aquela inverdade.“Então devo imaginar essa magnetização? Imagino alguma linda dama, sábia e mística, aparecendo no meio do povo de um campo de feno em Tarragon, no Illinois? Posso fazer isso, mas é só isso, é apenas a minha imaginação”.
Ele olhou para o céu com um ar de desespero, céu que no momento era representado pelo teto de chapa de metal e luz fria do Café Em e Edna.
- Apenas sua imaginação? Claro que é sua imaginação! Este mundo é a sua imaginação, já se esqueceu disso? Onde está o seu pensamento, aí está a sua experiência. Conforme o homem pensar, assim será ele; aquilo que receei aconteceu-me; pense e enriqueça: Visualização criativa para o divertimento e lucro; como encontrar amigos sendo quem você é.A sua imaginação não muda o Ser em nada, não afeta a realidade em absoluto. Mas estamos falando sobre mundos da Warner Brothers, vidas da MGM, e cada segundo dessas vidas são ilusões e imaginações. Todos sonhos são como símbolos que nós, sonhadores despertos, conjuramos para nós.
Ele alinhou seu garfo e faca, como se estivesse construindo uma ponte do lugar dele até ao meu.
- Você quer saber o que dizem os seus sonhos? É o mesmo que olhar desperto para as coisas de sua vida e perguntar-lhes o que representam. Você com os aviões em sua vida, cada vez que se vira.
“Bem, Don, sim. – Eu preferia que ele fosse mais devagar, e não empilhasse isso tudo de uma vez; um quilômetro e meio por minuto é depressa demais para idéias novas”.
- Se você sonhasse com aviões, o que é que isso significaria para você?
“Bom, a liberdade. Sonhos com aviões são uma fuga e eu me libertando”.
- E ainda quer maior clareza? O sonho desperto é o mesmo: a sua vontade de livrar-se de todas as coisas que o prendem... a rotina, a autoridade, a caceteação, a gravidade. O que você ainda não entendeu é que já está livre, e sempre esteve...
Se você tivesse a metade das sementes de gergelim disso... Você já é o senhor supremo da sua vida de mágico. Apenas a imaginação! O que é que você está dizendo?...
A garçonete olhava para ele com estranheza, de vez em quando, enxugando a louça, escutando, matutando quem seria aquele homem.
“Então você nunca se sente só, Don?” – perguntei.
- A não ser que sinta vontade disso. Tenho amigos em outras dimensões que se encontram em volta de mim, de vez em quando. E você também.
“Não. Estou falando desta dimensão, esse mundo imaginário. Mostre-me o que você quer dizer, dê-me um milagrezinho do ímã... Quero mesmo aprender isso”.
- É você quem vai mostrar-me – disse ele. – Para pôr alguma coisa em sua vida, imagine que ela já está aí.
“Como o quê? Como a minha linda dama?”
- Qualquer coisa. Não a sua dama. E uma coisa pequena, a princípio.
“Devo praticar agora?”
- Sim.
“O.K. Uma pena azul”.
Ele olhou para mim francamente.
- Richard? Uma pena azul?
“Você disse qualquer coisa”.
Ele deu de ombros.
- O.K. Uma pena azul. Imagine a pena. Visualize-a claramente, de modo a poder ver todas as suas linhas e bordas, a ponta, o cálamo. Só por um minuto. Depois pare.Fechei os olhos por um minuto e vi com nitidez em minha mente, uma imagem uns 12 centímetros de comprimento, de uma azul iridescente, prateando-se nas bordas. Uma pena brilhante e nítida flutuando no escuro.
- Envolva-a numa luz dourada, se quiser. Essa é uma técnica que ajuda a tornar a coisa real, mas também funciona no magnetismo.
Envolvi a pena num brilho dourado.
“O.K.”
- Pronto. Pode abrir os olhos agora.
Abri os olhos.
“Onde está a minha pena?”
- Se estava nítida em seu pensamento, nesse instante mesmo ela o estará atropelando como um caminhão.
"Minha pena? Como um caminhão?”
- Em sentido figurado, Richard.
Durante toda a tarde esperei que a pena aparecesse, e nada aconteceu. Foi de tardinha, na hora do jantar, comendo um hambúrguer, que eu a vi. Numa figurinha no invólucro do leite. Embalada para a Leiteria Scott pelas Fazendas da Pena Azul, Bryan, Ohio.
“Don! A minha pena!”
Ele olhou e deu de ombros.
- Pensei que quisesse a pena de verdade.
“Bem, qualquer pena serve, para começar, não acha?”
- Você viu a pena sozinha, ou a estava segurando na mão?
“Sozinha”.
- Então está explicado. Se você quiser estar com aquilo que está magnetizando, tem de se colocar na cena, também. Desculpe-me por não ter esclarecido esse ponto.
Uma sensação estranha, bizarra. Funcionava! Tinha conscientemente magnetizado a minha primeira coisa.
“Hoje uma pena – disse eu – amanhã o mundo!”
- Cuidado Richard – disse ele, me provocando – ou se arrependerá... [®]
(Campos de Raphael)
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